Ao ler este livro de Fabrício Cunha, admito que fiquei transitando entre gostar de algumas coisas e não gostar de uma forma mais generalizada. O autor sabe como escrever bem e tem seu estilo bastante marcante no livro. Ele intercala uma sequência de frases curtas em parágrafos enxutos onde vai construindo o seu pensamento para, depois, vir com um parágrafo um pouco mais longo, entrecortado, isto torna o texto ágil e interessante, um exemplo é o início do conto "O Primeiro Chicabon a Gente Nunca Esquece":
Percebe-se a sequência de frases curtas para formar o pensamento do leitor na direção do clima que o autor cria com o sentido de tentar prender a atenção até o desfecho.
Este formato ocorre no livro todo. O autor não constrói frases longas, sua intenção é criar uma leitura rápida, isenta de formas requintadas e de dificuldades semânticas. Vai sempre direto ao assunto, sem floreios.
Este estilo funcionou muito bem nos textos curtos, de duas a seis páginas, em que se esperava uma rápida solução para a história. Com isso, percebe-se que houve uma dificuldade em construir uma história longa e o estilo não funcionou para a única história longa, o conto "Ela, era ela, é ela", pois acabou por ser de uma leitura previsível e cansativa, uma vez que se advinha a história na medida em que vai acontecendo e que não há uma construção forte dos personagens.
Então, a forma que o autor propõe tem uma leitura aprazível nos textos curtos pois seu estilo é bom.funciona para estes textos.
Aí entro na questão do tema do livro que e a busca pelo sexo oposto e, deste ponto de vista, fiquei um pouco decepcionado e em dúvida quanto à intenção do autor em mostrar as questões emocionais (subtítulo do livro) de forma tão superficial, reduzindo o relacionamento às questões sexuais. Gosto de pensar que o autor de um livro não é o seu personagem principal, o autor cria um personagem e trabalha com ele, ainda que esteja escrevendo em primeira pessoa. Este personagem protagonista do livro parece que está eternamente cheio de testosterona, fazendo sexo com todas as mulheres que aparecem pela frente.
Preciso dizer que os contos deste livro me passaram uma visão onde os relacionamentos estão cercados de machismo. as personagens femininas são mostradas apenas como objetos do prazer do protagonista, elas não tem voz, não tem vez, e vivem como se estivessem em outro mundo, inacessível para o homem, fazendo-se a devida exceção para o momento do sexo que passa a ser o elo entre os mundos masculino e feminino. Não há muitos sentimentos, a vida se resume a busca do prazer, a tentar um momento (ou vários) de sexo, a perfomance é mais importante do que a intimidade. Senti-me dentro de uma propaganda de cerveja de milho transgênico, numa praia em que os homens estão atrás das mulheres bonitas e acham que bebendo vão conquistar o sexo desejado. Nota-se a importância do aspecto físico, não basta ser mulher, tem de ser bonita, não basta ser bonita, tem de aceitar ser objeto de prazer. O relacionamento é um consumo, assim como os produtos de um supermercado.
A minha dúvida é: o autor pensa assim ou está, com o livro, mostrando o seu lado de crítica social. Parece-me que ele está dizendo que a sociedade é assim mas não deveria ser machista, utilitarista (transforma pessoas em objeto), rasa nos relacionamentos, egoísta. Ao contrário, deveria ser mais profunda, solidária, não consumista, onde as pessoas deveriam ser vistas no todo, considerando as suas tristezas, alegrias, conquistas pessoais e coletivas, sentimentos.
Ao ler o livro, espero que o leitor considere as questões acima e não tome a vida mostrada pelo autor como a correta.
Se o protagonista é um "ferrado emocional", diria que mereceu ser assim ao considerar a forma como enxerga as pessoas do sexo oposto. A visão que o protagonista dos contos oferece é justamente aquela que se tenta combater mas que é real, está presente na sociedade e influencia a todos. Sou contra esta visão machista, misógina, sexista, consumista, egoísta. Desejo que as pessoas sejam sempre mais solidárias, sociais, coletivas, acolhedoras, não consumistas.
3 comentários:
Fernando, você é um danado!
'Corta pela raiz o que não dá flor'...
Eu amei demais o primeiro livro do Fabrício, (Eu TU ELE ELES), você precisa ler.
É muito diferente dessa linha que ele optou dessa vez.
Também comungo com o seu sentimento.
Juro que tentei!
Não li o livro. Nenhum deles. Conheço o autor. Imagino que ele seja um escritor medíocre, assim como foi um Pastor medíocre.
Olá, Anônimo, gostaria que se identificasse. A única resposta que posso lhe dar é que leia o livro para saber. Entendo que ele sabe escrever bem, com muita coerência. Dar opinião sobre o que não se leu não colabora para o autor.
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