quinta-feira, 6 de junho de 2013

Olhos de Vidro para enxergar por dentro de si

     Venho arriscar-me muito ao tecer comentários deste livro interessante de Andrea de Barros. Afinal, falar de uma Mestre em Literatura e Crítica Literária pela USP não será tarefa fácil, mas, eu gosto de correr riscos e vale a pena falar deste pois tem bastante qualidade poética.
     Este pequeno livro, "Para Seus Olhos de Vidro", lançado em Março de 2013 traz dentro uma dor aguda dos amores experimentados, vividos, com a certeza de que nenhum amor é perdido, tudo é conhecimento adquirido e transformação de vida, por piores que sejam as experiências. Lendo, tentei encontrar o tema predominante e fiquei em dúvida se o livro tratava de amores ou da resiliência, pois, percebe-se no fundo que a autora se mostra viva, firme, resistente, apesar de tudo o que sofreu. Ela não expôs apenas o sofrimento, o qual podemos deduzir, mas a sua resistência a ele.
     Vejamos que ela começa o livro com:

Idade

É o tempo

Que me corta os dias
O mesmo
Que me conta os casos

Dos quandos

Que eu não mais ouvia
Aos comos
Sem porquês dos atos

É dele

Meu desenho à pele
O mapa
Pelo qual escapo
Da velha juventude eterna

Ao tempo

Meu melhor bom dia
Sem medo do que o sol me tira
Me farto do que a luz me soma

     Ao dizer que o tempo vai lhe cortando mas ainda assim ela lhe dá o seu melhor bom dia sem medo, a poetisa vem dizer que resiste, que ele pode trazer o que for mas ela não terá mais medo do que lhe for tirado porque aprender a viver com o que lhe foi acrescentado (as experiências acrescentam).

     Sobre este poema ainda vou acrescentar a forma de usar sílabas fracas e fortes no sentido de dar ritmo ao texto, veja que em "é o tempo", temos a sílaba poética "é o", fraca, depois, "tem-", forte, no verso seguinte "que / lhe ", fraco, fraco, "cor-", forte, "ta-os ", fraco, "dias", forte, ficando o ritmo, fraco, forte, fraco, fraco, forte, fraco, forte, melhorando, colocando f minúsculo para fraco e f maiúsculo para forte, o ritmo do poema é: f F f f F f F f F f f F f F.

     A poetisa utilizou-se muito da forma em seus poemas, alterna versos curtos e longos, faz estrofes com versos com métrica, mistura um e outro mas não fica restrita à forma, em muitos poemas, usa de construções que mais se assemelham a um texto em prosa, como em

Último

Eu não deixei de amar. Só me libertei de você.
Só atravessei a vidraça.
Só rompi os pontos, jorrei o verbo, cravei os caninos nos seus adjetivos.
Me insurgi.
(...)

     Retornando à questão da resiliência, ela traz também a ambiguidade do desejo, ora mostra-se ávida e cheia de amor, apaixonada, ora, mostra-se decepcionada e amargura, vamos aos exemplos:

     Em " Presença n.º 5": "Eu amo o cara que passa/ longe/ Em minha memória".
     Em "Para seus olhos de vidro": "E quando me olha/ me faz invisível"
     Em "Primeiro": "Saudade dos seus olhos na minha pele/"
     Em "Vermelho Verdade": "Não foi pra você/ A melhor poesia/"
     Em "Véspera": "Medo de me sentar na banqueta e pegar as doenças da sua família".

     Prevalece sempre o amor vivido e desejado e as marcas que ele trouxe e deixou na poetisa, as dores, as lembranças que não saem da memória e continuam ainda que o amor tenha acabado. Ao percorrer o livro, é este amor muito desejado e pouco realizado que fica em evidência, dando a entender que a dor do amor vivido foi maior do que a alegria que dele veio, onde senti bastante vigor em poemas mais duros como "Último", "Cônjuge", "Véspera".  Ao encerrar com "Adendo", ela mostra bem que entende melhor este amor vivido e sentido e continua se entregando a ele apesar de tudo.

      Não posso deixar de destacar o belo poema que ela fez para sua avó, Augusta em que começa com estes belos versos: "Eram seis... e a rede trançava fiapos de luz da janela tardia", e depois encerra com:  "Foi moça / Augusta Maria / Sem se dar conta / Que o tempo só / ia."

     A poesia de Andrea de Barros mostrou-se bastante intimista, voltada para suas próprias experiências amorosas, onde pouco identifiquei elementos de vínculo com seu tempo ou seu lugar, é uma poesia dela, de sua existência, de suas experiências que, lógico, podem ser compartilhadas e compreendidas pelos outros.  Isto ficou evidente em "No Escuro" em que diz: "Se a luz se apagar / ainda serei eu / no espelho?". Os elementos que encontrei de referências são bastante urbanos e universais, o que me leva a crer que o livro tem a função de expurgar e esmiuçar o caso específico das emoções que o amor vivido trouxe. A pessoa se entrega ao amor e depois sobra o quê? Para mim, ficou este o questionamento do livro, de certa forma respondido ao longo das páginas.

      Lembrou-me outra autora que comentei aqui neste blog há pouco tempo, Débora Valim, que também, de certa forma, fez do seu livro um expurgo de mágoas e ressentimentos vividos. Cabe aí um questionamento interessante, se pensarmos que são formas de mostrar uma condição feminina diante do amor vivido e que não é realizado. Estaria a nossa sociedade "vendendo" uma ideia de amor que não corresponde à realidade? Existe mesmo este amor romântico, desejado e buscado, principalmente pelas mulheres? Ou estariam os homens enxergando a vida e o amor de uma maneira tão diferente que não estão vivendo no mesmo mundo que as mulheres? Questões para se pensar.

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Para quem se interessar em adquirir o livro, pode ir direto no link abaixo.
 http://www.editorapatua.com.br/index.php?option=com_content&view=article&id=105

segunda-feira, 3 de junho de 2013

Programação do VI Festival da Mantiqueira

        Segue a programação do VI Festival da Mantiqueira. Participarei no domingo, falando sobre o livro do Moacyr Pinto acompanhado dos excelentes André Freire, José Moraes e Paula Barja.
          A programação abaixo foi retirada do Jornal "O VALE" de domingo.